quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Não tenho nada contra, mas...

O preconceito, escondido em metáforas, palavras soltas ao acaso e piadinhas e risos cúmplices, na realidade, denuncia o quanto nossos padrões culturais e visões de mundo carregam tanto desconhecimento em relação às várias faces da África. Particularmente no Brasil, cuja influência africana em nosso cotidiano é tão perceptível, viva e fundante, passou e ainda passa por um embranquecimento, uma “limpeza étnica” para parecer mais palatável, mais aceitável e claro, mais comercial.
Um dos espaços de (re)produção dos discursos racistas, travestidos ou não, é a escola. Neste espaço, de uma forma ou de outra, as histórias, as religiões, a culinária, o conceito de beleza e de visões de mundo de negros e negras brasileiros tem sido sistematicamente resignificados.
E um dos momentos mais interessantes de se observar como a escola “vê” a questão racial são as comemorações da Semana da Consciência Negra. Quando elas acontecem (se acontecem) o preconceito inevitavelmente aparece, principalmente quando envolve a religiosidade, traço importante para conhecermos as Áfricas.
A crítica ao ensino da cultura africana que enfoque as suas religiões parte principalmente de professores e professoras conservadores e principalmente, evangélicos, em sua maioria, neopentecostais.
A Igreja Católica (ou melhor, os/as adeptos/as) tem historicamente uma relação (mesmo dúbia) de tolerância com o candomblé, umbanda, quibanda e outras manifestações religiosas de origem e/ou influência africana. As articulações, às vezes bastante imbricadas entre elas e o catolicismo, permitem diversas manifestações de fé. Católicos que fazem simpatias, que recorrem tanto às cartas como aos búzios e as novenas além de candomblecistas que se declaram como católicos/as não são raros de se encontrar.
Alias, é justamente o contrário. Eu mesmo sou pertencente a uma família de tradição católica que procurava cirurgias espirituais e leitoras de mão e de cartas no sábado e ia à missa ao domingo.
Mas com o crescimento exponencial de cristãos evangélicos nos últimos 30 anos essa história de relativa tolerância vem se modificando. Não são raros, portanto, os discursos de intolerância, preconceito e exclusão das manifestações da religiosidade africana nos espaços escolares.
Fica evidente então que uma numerosa e “barulhenta” parcela da população brasileira está mudando o modo de ver o mundo e principalmente, estabelecendo novos parâmetros de se relacionar com a diversidade cultural, traço marcante em nosso país. E confesso que eu estou preocupado com os rumos desse discurso, dessas ações, desse verdadeiro exército de Cristo.
Partem, evidentemente, de uma leitura da Bíblia, que é legítima como possibilidade da liberdade religiosa, direito tão importante para qualquer país que se diga democrático. E o direito à prática religiosa (ou a sua não-prática) é garantido constitucionalmente sendo um dos pilares das garantias individuais. Não é isso, portanto, que está em discussão, mas sim, o contrário; Uma expressão da fé que acaba por solapar, descaracterizar e subjugar uma outra. O “trator” evangélico não deixa de pé qualquer possibilidade de debate sobre religiosidade de matriz africana.
A informal tolerância não tem espaço entre parte significativa dos cristãos evangélicos. Algumas denominações, mais extremas, chegam a explicitar sobre o perigo da tolerância já que deus não é tolerante e incitam a não tolerar o que não venha de Deus, já que tolerar é compactuar. Quem não tolera, extermina, não é Hitler?
Por ser “coisa do demônio”, as cosmologias e cosmogonias africanas são simplesmente ignoradas. Búzios, terreiro, exús, oferendas, orixás, caboclos, guias, atabaques, o povo de santo, enfim, tudo que se relaciona com as religiões africanas vira macumba, coisa ruim ou pecado que portanto deve ser denunciado e principalmente, combatido.
As escolas funcionam como uma caixa de ressonância que gera e amplifica esses discursos vindos de todos os lados, desde a mãe do aluno ou aluna, como também da servidora, do porteiro, da professora ou professor, de membros da equipe gestora de “parceiros da escola”.
E essa visão de mundo, claro, vai influenciar nas escolhas dos currículos (sejam eles ocultos ou oficiais), nas várias avaliações (desde problemas de aprendizagem e comportamentais relacionados com possessões demoníacas), nas relações interpessoais, na hora da entrada dos alunos e alunas. A proximidade ou distância de deus irá determinar o sucesso ou o fracasso escolar, a estrutura (ou a falta dela) das famílias, as oportunidades e os obstáculos presentes no dia-a-dia da escola e fora dela.
A obrigatoriedade do ensino da história africana no Brasil, se por um lado é amplamente ignorado nas escolas, por outro, a história dos povos africanos é reduzido à escravidão. Pouco se fala da resistência e dos heróis e heroínas negros em sua luta pelo fim da escravidão e pela sua emancipação. A princesa Isabel continua sendo vista como a redentora, a valorosa, a mais humana na corte do Imperador.
Evidentemente que muitas ações vêm sendo desenvolvidas para que esse quadro se reverta. Cursos, debates, conferência e o diálogo são importantes para a formação de professores e professoras. Tanto as políticas públicas como as iniciativas populares vão possibilitando um maior número de pessoas, a conhecer as nuances da história de africanos e africanas no Brasil. Mas o discurso conservador, fundamentalista e religiosos reage numa rapidez muito maior que nossa capacidade de articulação.
Talvez seja por isso que vejo a necessidade de criarmos uma rede nacional de educadores e educadoras pela igualdade a fim de compartilharmos experiências, refletirmos coletivamente assim organizar a contraposição ao discurso dos/das intolerantes.
Se a escola é campo de disputa hegemônica, por ser um espaço privilegiado de formação humana, por ser tanto um aparelho ideológico do Estado como por carregar em sua própria constituição a capacidade de transformação, cabe aos educadores e educadoras pela diversidade a também definir um discurso, tão poderoso quanto o outro.
A história da humanidade está repleta de exemplos de visões explícitas de ódio. O genocídio, o etnocídio, a ideia de uma cultura ou visão de mundo superior a outra e os vários tipos de apartheid. A tolerância é fundamental, importante e expoente de uma atitude de respeito. E as práticas educacionais advindas do discurso de tolerância e respeito ao diferente são mais do que bem-vindas; são essenciais.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

PELO DIREITO DE DAR PINTA!

Não sei por qual motivo eu ainda perco o meu tempo lendo os malditos comentários de leitores dos jornais virtuais. Talvez por causa dessa curiosidade "antropológica" de saber o que a submergente classe média pensa, seja talvez pela esperança meio budista de encontrar no meio do lodo, uma flor de lótus, uma reflexão sensata, necessária e capaz de nos surpreender.
O Marc...o Nanini, numa entrevista há poucos dias, falou de sua vida amorosa (ou a falta dela). Falava, entre, outras coisas, sobre seus namorados. Todos os sites de notícias (?) e fofocas começaram a replicar a notícia, manchetando que o Lineu, da Grande Família, enfim, saía do armário. Bom, ao menos para um monte de gente, o fato do Nanini ser gay não é novidade há décadas e que, como ele mesmo disse depois, não saiu do armário porque nunca esteve lá dentro.
Mas, junto com a declaração, vieram os tais comentários. Um deles, vindo dos tais leitores me chamou muito a atenção: "Ao menos ele não desmunheca e não rebola!"
Imediatamente essa fala me jogou lá na minha infância e adolescência, quando meu pai, minha mãe, os "colegas da escola", a vizinhança, a parentaiada, enfim, todo mundo me dizia como (não) andar, como (não) falar, como (não) gesticular as mãos.... Pare de rebolar! Fale grosso! Vá pro karatê! Vá trabalhar na oficina do seu pai! não brinque de boneca! não use as roupas e os saltos das irmãs! não chore por qualquer coisa! Não seja você! Seja Homem! Ou, ainda: "Você pode até ser viado, mas ninguém precisa saber".
O fato de um cara gay dar pinta, de "fechar" incomoda tanto que dentre comunidade gay, os que mais são assassinados, além das travestis, são "as pintosas", as fechativas, as que riem alto, que balançam os ombros e batem o cabelo! Até mesmo entre nós, gays, a pintosa só é tolerada em poucos momentos: no palco, numa festa reservada ou montada nos guetos do pink market. Como amiga, as coisas complicam porque a pintosa "queima o filme", espanta os pretendentes e explicita um discurso que nós reproduzimos: Não precisa desmunhecar pra ser gay! .
Voltando aos comentários, outros ainda, na tentativa de disfarçar seu preconceito diziam que "isso", ou seja, o fato do Nanini ser gay não afetaria sua admiração pelo trabalho dele na TV. Caramba! O pior dos preconceitos é aquele que a gente insiste em não revelar.
É por essas e outras que sempre achei que a pinta é revolucionária, porque subverte a ordem, escancara a liberdade de ser exatamente como quer, sem pudores, sem amarras, jogando na cara dos caretas, dos fundamentalistas, dos enrustidos e dos conservadores as várias possibilidades de se expressar no mundo.
PINTOSAS DO MUNDO, UNI-VOS NO REQUEBRAR E NO DESMUNHECAR!

O livre espaço do campus.

Apesar dos caguetas, dos X9, dos delatores e dos infiltrados, durante a ditadura militar, apenas uma vez um campus universitário foi invadido pela polícia: em 1968, na UNB. O que era excessão, virou rotina. O que não fizeram na ditadura, agora fazem com frequência, em nome da tal Ordem.
Durante minha graduação,na UFG, por três vezes, a PM do coronel do Cerrado, Sr. Marconi Perigo, invadiu o camp...us. Nas duas primeiras, por causa das manifestações pela melhoria do transporte coletivo (na qual um "kombeiro" foi morto) e na última, durante o lançamento de um livro, o Dossiê K, escrito pelo Kajuru, que denunciava o uso da máquina e abuso do poder econômico nas eleições em que Marconi sagrou-se vencedor. A Rotan invadiu o Campus, recolheu os livros e agrediu um sem número de estudantes. A imprensa provinciana, claro, aplaudiu a ação.
Nos últimos anos, a PM também invadiu os campus da UFPR, da UNEB, da UFPel e por aí vai e por duas vezes a USP foi invadida.
Não vou me ater ao fato da USP ser um celeiro de playboys e patricinhas bem nascidos e ricos. O que me incomoda é que a autonomia da universidade, esse espaço privilegiado de experimentações, de devaneios e de produção acadêmica, de livre pensamento e contestação de costumes e comportamentos está se tornando, cada vez mais, um curral cercado pelo conservadorismo, pelo bom-mocismo e pela caretice.
Mesmo que possa parecer algo pequeno, diante das revoltas estudantis no Chile, no norte da África ou do maio de 68, os estudantes e o espaço universitário, seja da USP, ou de qualquer outra universidade, pública ou privada, não podem ser atacados pelo aparelho repressor do Estado.
Estamos nos acostumando, cada vez mais, a ver o falso moralismo, o fundamentalismo escroto e tacanho tomar as rédeas, auxiliados, claro, pela nojenta mídia direitosa que não suporta qualquer (des)ordem. E vamos acreditando, cada vez mais, que o "endireitamento" da universidade é vital para o sucesso do ridículo capitalismo brasileiro.
Viva a desordem! Viva o caminho torto! Fodam-se os puretas!

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Escola não é igreja e sala de aula não é púlpito.

Escola não é igreja e sala de aula não é púlpito.
Há muito pouco tempo atrás, evangélicos (as) eram massacrados, humilhados, discriminados, vilipendiados do direito de professar sua fé, atacados pelos meios de comunicação e pelos círculos intelectuais. Todo e qualquer estudo apontava que em sua maioria, eles e elas eram analfabetos, pobres e moradores das periferias de grandes cidades.
Aos poucos essa realidade foi se modificando... Alcançaram o poder, constituíram uma forte bancada nos parlamentos, converteram a classe média e alta além de intelectuais, assumiram o controle de inúmeras estações de rádio e de televisão, seus templos cresceram e estão em bairros centrais e nobres.
Entretanto, somente uma coisa não se modificou: A dificuldade deles de se relacionarem com outras religiões, a convicção de que somente eles e elas estão a salvo e todos os outros vão queimar no fogo do inferno, que religiões de matriz africana são primitivas e demoníacas.
Nâo mudou também a interpretação da Bíblia sob uma ótica fundamentalista e a certeza de que o mundo, sob seus auspícios é melhor e perfeito por serem o povo eleito e escolhido por deus.
Se acham que todos estão errados, que eles e elas devem ser o exército de deus na Terra, que são vasos santificados, verdadeiros representantes do divino neste vale de lágrimas, sugiro que comprem uma ilha (por que dinheiro para isso eles tem por causa das isenções de impostos), de preferência no meio do Pacífico e construam lá um mundo novo, sem pecado, sem ganância, sem macumba, sem gays, sem prostituição, sem roubalheira, sem adultério.
Instaurem uma república cuja constituição seja os dez mandamentos, o hino nacional cantado pela Aline Barros e o presidente o Malafaia.
Lá, com certeza, eles poderão orar em línguas,repreender o demônio que se apossa dos corpos dos alunos e alunas, não trabalhar o dia da consciência negra, expulsar gays e converter infiéis.
Viver em democracia não é fácil! Numa teocracia é pior ainda.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

O Novo Currículo ou reinventando a roda?

No final do no passado, todas as escolas foram convocadas, para receberem, no Centro de Convenções, a versão preliminar do Currículo da Educação Básica, para que, no decorrer deste ano letivo, ela fosse modificada, recebendo contribuições, críticas, sugestões e reflexões de todos nós, professores e professoras, equipes gestoras, coordenações e supervisões pedagógicas e estudantes.

A partir de 03 de agosto, quando acontece mais um dia temático, além da leitura de diversos textos, indicados pela SEDF, vamos escolher os/as representantes das escolas que participarão de Plenárias Regionais, entre os meses de setembro e outubro, que indicarão nossas propostas.

Espera-se, portanto, uma grande mobilização da categoria, já que estas orientações curriculares tem, a princípio, uma durabilidade de 10 anos.

É então uma boa oportunidade para que nós possamos, à luz de nossas experiências cotidianas e das pesquisas acumuladas sobre o tema, definir o que vamos ensinar e como fazê-lo, levando em consideração os interesses dos/as estudantes, do mundo do trabalho e do Estado.

Entretanto, o que me preocupa é que se não tomarmos as rédeas desse processo ( o que pra mim é bem provável), a SEDF pode definir os rumos das políticas educacionais sem sermos consultados, ou que é pior, utilizando os artifícios já conhecidos (o velho verniz democrático) para implementar a tal Escola do Cerrado.

Entre as discussões já definidas estão a implantação dos ciclos para as séries finais e no limite, para o Ensino Médio (aos moldes do que já acontece com o Bloco Inicial de Alfabetização), redefinição da EJA, correção de fluxo, sistemas de avaliação, àreas do conhecimento, e por aí vai.

Apesar de já estarmos meio cansados e carimbados com essa história de discussão sobre currículo, penso ser fundamental nos interarmos sobre esses debates, sobre quais critérios serão utilizados para a construção dessas orientações, e, principalmente, resignificarmos nosso papel nesse processo: Será que nossos ceticismo será preponderante? Como podemos influir nessa discussão? E isso, pessoal, é pra ontem!

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Postando comentários.

Para deixar algum comentário é só clicar no final do post onde está escrito Comentários. Vai abrir uma janela, e aí sim, deixe sua crítica, sua contribuição, sua opinião. Essa sala é de todos e todas.

terça-feira, 26 de julho de 2011

NOJENTO! VIADO!

"Olha aqui seu biba, deveria se informar mais, o que o supremo fez, nada mais foi que rasgar a nossa constituição. O STF é submisso as Leis, cabe a eles julgarem de acordo com o que está na constituição, e já que vc é intelectualóide, pesquise e veja o que a nossa Carta Magna diz. Eu tenho formação esquerdista também, mas o que Marx disse, não foi escrito em ferro e nem cunhado em pedra, não é verdade absoluta! não preciso absorver tudo com minha verdade, o que vai contra o que eu acredito eu relevo,pois tenho a capacidade de filtrar informações... Eu não me educo por metidos a intelectualoides, e prezo muito mais a faculdade da vida que a que recebi na Universidade, pois esta me ensinou a ser homem, honesto, honrado e po-li-ti-za-do! passei por muitas dificuldades na vida também, mas tenho muito orgulho de ter passado o que passei e nunca tive vergonha de ser pobre. Pessoas como vc que prega o fim da família, eu sou a favor da natureza, ambientalistas pregam para deixar a natureza seguir seu fluxo... uma vez assim não podemos aceitar essa bizarrice de gays, pois o fluxo natural é homem e mulher, assim a raça humana prospera! Nojento! Viado!"


Depois de tantos anos sem ouvir palavras tão preconceituosas, confesso que me assustei quando li este comentário, enviado por um colega professor, após a leitura de minha opinião sobre a decisão do STF em oficializar a união civil entre pessoas do mesmo sexo, postado aqui no blog.

Evidentemente que o nobre colega não teve tanta coragem assim de assinar, mas isso é o de menos, esquece ele que hoje é possível rastrear toda e qualquer movimentação na internet e em breve ele receberá notícias minhas.

Mas, é importante a análise. A cada dia, pessoas como esse professor demonstram mais sua irracionalidade, seu ódio e sua dificuldade de conviver em sociedade e com as diferenças. Não é à toa que todos os dias, a violência contra homossexuais está se tornando comum. Aliás, a intolerância está chegando ao limite como no caso do pai e filho que, confundidos com um casal gay, foi barbaramente espancado no interior de São Paulo, como o assassinato de uma garota lésbica, no interior de Goiás ou nos ataques em plena Avenida Paulista.

Apesar de temer pela violência, reações como a do colega professor só demonstram, mais claramente, a necessidade urgente da criminalização da homofobia, da instituição de um projeto nacional de combate à violência homofóbica dentro e fora das escolas, e principalmente, do avanço nos nossos direitos.


Esse fato me fez lembrar algo que aconteceu comigo há muitos, muitos anos atrás, lá em Anápolis.

Tinha um cara, amigo de meu pai, que toda vez que me via, me xingava, ria, cutucava os outros caras para me ridicularizarem. De tanto escutar as suas piadinhas, dava uma volta tremenda para chegar em minha casa, só pra não passar perto da esquina onde ele morava. Mesmo sofrendo essa violência cotidiana, preferi não contar para os meus pais.

Um belo dia (sempre tem um dia), fui à padaria comprar pão e a casa desse cara era bem em frente. Como a padaria ainda estava fechada, sentei na calçada para esperar. Levei um susto quando vi o cara, me olhando, pelo portão. Passados alguns segundos, ele me aparece, pelado, me chamando para entrar. Fiquei tão enojado com aquela cena! Fiquei puto! Como o cara que mais me humilhava, estava ali, pelado, todo excitado, querendo todo mundo sabe o que.

Aí fui entender: O cara, na realidade, era um gay enrustido, que jamais teria coragem de se assumir e para afastar qualquer possibilidade de alguém desconfiar dele, ele me apontava!

Pra mim, e pra um monte de psicólogos e psicólogas, geralmente os homofóbicos tem uma sexualidade tão mal resolvida que atacam, violentam, massacram e matam para se verem livres de um culpa, de um tormento, de um desejo reprimido. Caras com sexualidade resolvida não se importam com a vida sexual dos outros.


Para o nobre professor que tentou me atingir com insultos, um recado: Vá se tratar! Homofobia tem cura! E se pensa que esse tipo de atitude me intimida, está muito, muito enganado. Ao contrário. Como escrevi no post, os latidos vão ser altos, os rosnados bem raivosos, e as vezes as mordidas podem ser dolorosas, mas NÓS VAMOS CONQUISTAR NOSSOS DIREITOS! Duvida?

domingo, 24 de julho de 2011

Se o mundo é mesmo parecido com que vejo...

Cena 1: um aluno (desses com vários W, Y, LL no nome), num dos vários rompantes de agressividade durante o período de aula, além de dar um tapa na cara do colega, manda o outro chpar a ponta de sua "pica" e xinga a mãe do pobre coitado de "arrombada". Detalhe: Esse doce de candura tem apenas 9 anos, aluno de uma turma do 4º ano.


Cena 2: A avó da criatura, chamada pela professora e pela equipe pedagógica, começa a chorar o vale de lágrimas: O pai do aluno foi assassinado, a mãe, que já foi presa, não quer saber do moleque, o padrasto está preso, e a irmã mais velha, que já foi aluna da escola, hoje com 15 anos, se prostitui por pouco, muito pouco. No lote onde fica a casa desse menino, são três barracos, todos ocupados pela mesma família e seis primos, com o mesmo comportamento, são estudantes da mesma escola. Drogas, alcoolismo, brigas constantes! No meio disso tudo uma avó que luta, praticamente sozinha, para manter e sustentar tudo e todos.


Cena 3: Depois da longa conversa, propostas e palavras de encorajamento, me veio a constatação diária: O que fazer? Tudo o que penso me parece pouco, inútil, compensatório. Seria essa a educação para os mais pobres? Para essas crianças, o destino já está traçado? Que forças descomunais esses meninos e meninas terão que ter para conseguir sair dessa trágica situação? E o que é pior: Muito provavelmente, eles terão que fazer isso sozinho ou com muito pouca ajuda. A maioria vai formando a classe dos numerosos sobrantes... Aqueles que vão pegar o resto, do resto, do resto...


Depois do relato da avó, tentamos ainda disfarçar a nossa incapacidade. Buscamos o Conselho Tutelar, a Assistência Social, a Vila Olímpica... Só que, mais uma vez, senti na pele, o nosso limite. Mais do que nunca, tenho a certeza de que sozinhos, não conseguiremos mudar essa situação, já que nós mesmos, professores e professoras, precisamos de ajuda.


Milhares de crianças estão hoje em nossas escolas, numa situação muito similar ou até pior do que esse aluno. Apesar do discurso de que é na escola que essas crianças encontraram os mecanismos para sua liberdade, o que vemos é uma escola que embrutece, que não acolhe, que não ensina.


A escola é um grande palco onde encenamos, diariamente, o discurso da superação, quando nós mesmos, peças da engrenagem, não acreditamos mais nisso.


Tudo é tão feio... tão incompleto... tão sem boniteza... um reflexo das favelas e das satélites tão pobres. Vielas, esgoto ao ar livre, ratos, canos quebrados, vidros quebrados, piso quebrado. A escola marcada pelo improviso é a extensão da feiúra da vida desses meninos e meninas.


Mas não poderia ser diferente. O que é destinado aos mais pobres é sempre feio, mal cheiroso, não funciona, humilha, envergonha e revolta.


Por isso, meus amigos e amigas, em nossas carreiras vamos nos deparar com uma realidade difícil de digerir. Realidade essa que a gente não vai conseguir mudar sozinhos ou com discursos.


Ainda não encontrei o caminho para a mudança... Mas não me canso de procurar.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Esse universo chamado ESCOLA.

Comecei minha vida escolar no Instituto Nossa Senhora do Carmo, em Anápolis. Lá estudei no Jardim e no Pré. E foi lá, também, com as irmãs carmelitas, que iniciou esse prazer em estudar. Mas claro, começaram também meus atritos. Nunca esquecí que fui chamado de "pipoca" pela Irmã Edith por ter colocado o til no lugar errado na palavra mamãe. Mas depois veio a mais linda das professoras, cuja beleza se estendida até no nome: Flordenice! Era linda... meiga... acho que foi a primeira pessoa, fora do meu núcleo familiar, que amei.


Mas como o dinheiro ficou curto, tive que encarar a vida real. De lá, uma escola enorme, cheia de brinquedos, parquinhos, campos de areia, caí no Educandario Espírita. Era 1983 e estudava numa escola feia, suja, que tinha um banheiro tão horroroso que por vezes, preferíamos fazer xixi e cocô atrás de umas árvores...


Pra piorar, em 1984, eu e minhas irmãs fomos para uma escola municipal que ficava no bairro de periferia onde morávamos. Colégio Anhanguera, na Vila Formosa. Aí eu fui entender o que eram políticas compensatórias para crianças pobres. Tomávamos lombrigueiro para combater vermes, bochechávamos fluor para evitar cáries. Ganhávamos kits da antiga FAE com lápis, borracha, caderno, lápis de cor bem vagabundo, apontador, régua, compasso. E pronto. Tínhamos que fazer durar o máximo possível. Tinha as aulas de educação (i)moral e cívica, cantávamos o hino, rezávamos... Éramos todos massacrados pelas professoras e pela direção... E ainda tinham as malditas estagiárias da escola normal. Nada parecia o mundo que a Flordenice havia me apresentado.


Agora eu tinha a tia Veri (uma bruxa), a Tia Dulcimar (que vai ter o que merece um dia) e a tia Maria Alves (aqui se faz, aqui se paga!) Estão vendo a responsabilidade, colegas professores e professoras? Como é que passados quase 30 anos eu ainda tenho guardadas as impressões de cada uma de minhas primeiras professoras?


Terminei a 4ª série em 1986. E como o Carmo tinha um convênio com o Estado, pude retornar dando adeus ao Anhanguera e aos lombrigueiros.


Voltei pro Carmo e lá fiquei da 5ª a 8ª série. Mas a escola não era mais a mesma. Nem eu era mais o mesmo. E como foram bacanas aqueles anos. Foi nessa escola que tive meus primeiros grandes amigos, mas também foi onde eu sentí, pela primeira vez, vergonha de ser pobre. Era um dos poucos bolsistas e as freiras faziam questão de frisar isso. Nós não podíamos tirar notas baixas, fazer bagunça, deixar de participar das missas. Se acontecesse algo fora do estabelecido, claro, jogavam na nossa cara nossa condição.


Bom! Ter reprovado por duas vezes (na 6ª e na 7ª) não ajudou em nada minha relação com as freiras. Além do mais, como eu adorava tocar o terror! Não tinha esporte que eu mais adorava do que atazanar a vida delas. E modéstia às favas, eu consegui... Ah! Como consegui! Coitada de minha mãe. Ela que escutava... E como apanhei dela por causa de minhas incontáveis travessuras!


Mas fui passando por transformações por causa dessa diferença de tratamento. A vergonha de ser pobre foi se transformando em revolta! Ainda mais que na 8ª série começamos a estudar o mundo e que mundo diferente era aquele... EUA x URSS, capitalismo x socialismo, muro de Berlim, Glasnost, Perestroika, Gorbachev, PT, Greves, Eleições presidenciais, Lula, Fora Collor! Comecei então a entender as razões da concentração de renda, da pobreza extrema, da falta de perspectivas, das dificuldades que meus pais viviam em casa em contraste com a vida de opulência dos colegas que dividiam o mesmo espaço comigo na escola.


Foi então, num colégio de freiras que o socialismo me foi apresentado, meu lado ateu se justificou e minha rebeldia de juventude começou a ter uma causa... Dialética marxista em estado bruto!


Terminada a 8ª série mais uma ruptura. Pra onde ir? Bom, já com 16 anos em 1993 era hora de procurar o que fazer além de dar aulas particulares. Trabalhar durante o dia e estudar a noite era a única solução. Consegui uma vaga num colégio de padres franciscanos que também tinham convênio com a Secretaria de Educação. Mas a Matemática, a Física e a Química foram difíceis demais pra mim. Resultado? Outra reprovação. A terceira!


Bom... Tive então que fazer uma outra escolha: Ir fazer Contabilidade num colégio estadual perto de minha casa. Ensino profissionalizante, sem qualquer perspectiva de reflexão, sem lanche, com salas lotadas de adolescentes que, assim como eu, privados de tudo, menos da vontade! Como estava desempregado, tentei seleção pra entrar numa papelaria. E passei. Durante o dia, na Papelaria Glória, como um burro de carga em tempo integral e a noite, moído, ia pra escola.


Como não queria seguir aquela carreira, no final do 3º ano, decidí prestar vestibular, mesmo não tendo nenhuma base dos conhecimentos necessários. Numa atitude corajosa, pedí as contas da papelaria e com o seguro desemprego, comprei uns fascículos em bancas, estudei na biblioteca pública, acordava cedinho pra ver as aulas do Telecurso. Fiz inscrição pra História na Universidade de Anápolis e Pedagogia na UFG(era o único curso noturno oferecido na época). Passei nos dois! Mais uma vez, tive que escolher: Ficar naquela porra de cidade que eu odiava, mas que tinha a segurança da família, ou ir pra Goiânia, sem nenhum centavo, com a cara e a coragem... Em 1997 estava em Goiânia, onde viví por 12 anos. Nunca mais fui o mesmo.


Nesta vida, cheia de escolhas, algumas foram acertadas, outras não. A mais correta talvez tenha sido a escolha da profissão, que tanto me orgulha, que tanto me faz um ser humano melhor!

segunda-feira, 18 de julho de 2011

A SURPRESA DO STF

Os ministros do STF aprovaram por 10 votos a 0 a união civil entre casais de mesmo sexo. O que isso significa, na prática? Que a constituição de uma família não é prerrogativa de gêneros distintos. Dous homens, duas mulheres, a mãe e sua filha, a avó e seus netos são considerados também, entidades familiares, com prerrogativas legais e direitos garantidos. E eu estava lá! Acompanhando aquela sessão histórica e vendo de perto as expressões de alegria de uns, a constrariedade de outros. Foi, ao menos pra mim, uma aula de legislação e de direito. O mais importante, etrentanto, é que o país entra no seletro grupo de países que começam a garantir direitos iguais para TODOS e para TODAS.


A partir dessa decisão, o Judiciário provoca o Legislativo a sair da inércia e do silêncio velado para definir o contorno dos direitos de milhões de gays e lésbicas brasileiros que são constantemente negados.


Evidentemente que no Congresso essa questão é mais espinhosa já que, uma bancada, ao utilizar o nome de deus, contribuie para a violência, para a discriminação e o preconceito.


Vivo com meu companheiro há anos e somente nestes últimos tempos é que vivenciamos lampejos da segurança jurídica, tão importante para qualquer casal que tem no amor e no afeto a sua vivência e existência. Mesmo assim, nos são negados 111 direitos, como adoção de crianças, financiamentos diversos, compartilhamentos de planos de saúde, e por aí vaí...


Mesmo saendo que os latidos serão altos, que os cães estarão cada vez mais ferozes e as mordidas, por vezes, dolorosas, sabemos que ainda estamos apenas começando...


Direitos iguais. Nem mais! Nem menos.